sábado, 18 de abril de 2009

paragem de autocarro

A vida é engraçada... Às vezes tudo o que queremos é que o destino deixe a sorte passar em forma de monstro de quatro rodas... Outras desejamos que ele nunca chegue, nunca passe, só para pudermos aproveitar aqueles minutos em que não temos que fazer nada mais, a não ser...esperar...
Sorte é algo relativo. Para muitos sorte seria chegar a casa depois de um dia complicado e não ter de se preocuparem com mais nada. Para outros é sair o euromilhões para finalmente puderem ir naquelas férias de sonho. E por pequenas fracções do dia pensamos: “´É hoje!” É hoje que o universo nos vai atirar aquela migalha satisfazendo os nossos pedidos, nas nossas cansadas cabeças, muito consideráveis!
Mas penso que o que me fez sair de casa neste chuvoso dia de Abril não foi a sorte ou o azar, nem o dever ou a obrigação...vim para aqui para ouvir os meus pensamentos, aqueles que mantenho em ruído de fundo para que não afectem a concentração, não posso deixar que falem porque não posso sentir.
Dramático? Talvez, mas duvido que exista alguém que discorde.
Olho em volta de todas as pessoas que passam naquela maratona do “Estou atrasado!” ou do “Ela vai-me matar!” mas só uma pessoa me sobressai. Um rapaz que brinca com a ponta do chapéu de chuva numa poça de água e que não parece afectado pelo mundo.
Chove a potes. Sorte a dos que podem vê-lo de perto, sentir o frio, ouvir a chuva... Azar o dos que se esqueceram do chapéu, azar o dos que não gostam de chuva. Mas já a minha avó dizia “A chuva é cá precisa” e sabedorias destas não se podem, nem se devem ignorar.
Mexe-se no banco como se toda a panorâmica da cidade o divertisse. Com um – e só um! – phone nos ouvidos parece absorver tudo o que o envolve: os barulhos, os movimentos, as imagens. Como se nunca quisesse esquece-los, como se desenha-se na sua mente um guião de um filme que varia tão rapidamente entre comédia e acção, romance ou aventura.
Pego no caderno, há algo de muito especial nas suas páginas amarelecidas da idade que faz com que ande sempre com ele. Foi-me oferecido por alguém muito especial que me disse: “Não penses numa história, escreve-a” e durante anos me atormentei com a ideia de que o tinha de guardar para algo especial até que me apercebi que tudo o que escreve-se seria especial se escreve-se o que pensava.
Hora de ponta, na paragem as pessoas comprimiam-se para que todas tivessem um espacinho seco enquanto esperavam pela única coisa que ainda era certa nas suas vidas. E sem pensar, levantei-me e deixei que uma senhora sentar-se no meu lugar, saí do pequeno cubículo e pela primeira vez durante toda a tarde senti as gotas de chuva na minha pele. Arrumei o caderno, mas sem pressas, se se molhasse só o iria tornar mais mágico.
Dentro da minha cabeça cada pensamento queria falar mais alto, até que só se ouviam gritos confusos, mas sabia bem, sabia bem ouvir-me no meio dos sons avassaladores da cidade.
Dei-me permissão para sorrir.
O rapaz saiu do cubículo e olhou para mim como se eu tivesse perdido do juízo...depois, para grande surpresa minha, sorriu também. E ficamos ali os dois, duas personagens de uma história que ainda nem tinha começado...

A vida é engraçada... Às vezes tudo o que queremos é que o destino deixe a sorte passar em forma de monstro de quatro rodas...

sábado, 4 de abril de 2009


Atirei mais uma vez a folha por cima do meu ombro, já não podia perspectivar as coisas de uma maneira diferente, já não havia outros pontos de vista! Olhei em volta e toda a sala parecida dominada por pequenas bolas de papel de tonalidades diferentes. “Os ambientalistas não vão gostar nada disto” pensei para comigo em jeito de piada seca para ver se me animava, isto antes de perceber que não tinha piada nenhuma. Mesmo assim, consegui arrancar um sorriso dos meus lábios. Olhei para a minha fiel companheira de quatro patas aninhada junto da minha secretária, de olhos brilhantes repletos de compreensão. Respirei fundo e deixei-me cair na cadeira de lona onde estivera toda a tarde a tentar escrever algo que não sabia muito bem como começar. O relógio atrás de mim não parava de balançar os seus ponteiros, sempre na mesma direcção avisando-me de que o tempo não iria voltar atrás, nem sequer por um segundo para me dar tempo para pôr as ideias em ordem. Completamente convicta de que a inspiração não iria voltar nas próximas horas - talvez dias! – levantei-me e abri a janela, de par em par, como se um raio de sol que fosse me deixasse sentir melhor comigo mesma. Afinal, o trabalho poderia esperar.
Cá fora, as crianças do bairro tinham-se juntado na praça para aproveitarem as férias, o sol e as horas livres, cada vez mais escassas. “Tenho saudades de ser assim” pensei alto, olhando depois em volta para garantir que nenhum ser me tinha escutado. O bonito dia que se desenrolava em frente dos meus olhos fez-me sentir pena de não poder sair para a rua, correr e deixar tudo para trás, nem que fosse por um só dia.
Olhei em volta e depois através da janela de novo.

Nem que fosse por um só dia...